quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Desenlace

A palavra não pronunciada, o abraço esquivado, a vontade esvaída, o desejo não mais absorto, um pálido sorriso...
O escasso excesso de vida que partiu feito a nau, sem alarde, sem dizer, sem ao menos pedir. Não, não traga mais flores, não mais pudores, sem mais... Quando quem riria por último sente já a exatidão do tempo nefasto, que carrega o mais belo instante e breve vai, não há mais razão para prosseguir.
No início, tudo eram amores, as promessas eram fundamentadas nos sentimentos mais puros, nas mentiras honestas. Havia o doce companheirismo, ao tempo em que a amizade transformava tudo em alegrias. O notável começo, por vezes efêmero, trazendo tudo o que se pode querer de algo tão esperado: beijos arrebatados, corações borbulhantes entregues à paixão dita eterna. O mesmo lar, os mesmos gostos, os mesmos pertences, as mesmas esperanças, o mesmo sonho. Era o momento de não mais maldizer a vida, ela era novamente bonita, seu apartamento era agora sereno, não havia mais invenções ou temores.
Versos rabiscados entregues em um papel dobrado, a conta de luz no verso, flores pela sala de estar, o asfalto queimando os pés para um abraço de saudade, por um abraço. A taça de Veuve Clicquot abandonada para uma boa noite, por uma noite. Tudo por uma noite, cada noite, a cada dia.
Porém, num lapso fugaz de uma existência, ao telefone, apenas um alô... a uma chegada, franzir o cenho... às atitudes egoístas, não mais o porquê... ao ciúme, o esquecimento... ao poeta, a dor. O pensamento estabelecido em contas a pagar. A quem culpar? A quem blasfemar? A quem julgar? A quem dizer? Por que chorar? Não, não há ninguém, não há nada, nem mesmo o nada. Há o que falta e faltará conhecer a razão, tão simples e inquestionável, porém tão imperceptível. Dúvidas, incertezas, sentindo apenas o apego, sem reconhecer o que já lhe é conhecido. Sem ver que na vida nem sempre é preciso um motivo.
E assim, tarde vai, sentindo tarde seu pesar. Tarde da noite. Tardando o dia. Simplesmente, tarde...